quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Básico ou primário, posto ensino?

— Mas, pensando bem no assunto, que vantagem vinha de todas as crianças serem poetas ou pintores?
— Quase todas, o Cortázar diz quase todas, não todas… E já te digo uma: crescendo, muitas delas ou mesmo… quase todas, já não teriam necessidade de tentar a poesia e a pintura. Estava feito. Há certas coisas por aí, tão execráveis, que no entanto se admiravam bem na infância. As crianças não precisam de criar obra, é a grande liberdade delas, só têm de fazer duas coisas: crescer e aprender. Crescer e aprender.
— Falas com acerto, ó Sócrates. Mas não me convences…
— Calha bem falares do Sócrates, porque podes ler a frase do Cortázar como, digamos, uma metonímia. Não apenas poetas e pintores, mas também filósofos, sobretudo filósofos. Crescer e aprender implica fazer perguntas. Ora a maldita instrução primária…
— ensino básico, maldito ensino básico…
— Ou isso. O maldito ensino básico domestica a arte da pergunta, treina as crianças para fazerem apenas perguntas úteis.
— Ora, alargas tanto que perdes de vista o alvo. Isso é o que faz todo o ensino. Não te lembras do que nos disse há dias o Bertrand Russel? O homem não nasce estúpido, nasce ignorante: a educação é que o faz estúpido.