sexta-feira, 23 de março de 2007

Desconchavando

— Hei, homem, por onde tens andado…
— … que tão farta lã tens criado!
— Cheio de espírito, o espírito!
— Reconheço que sim. O crescimento da sabedoria mede-se precisamente pela diminuição do mau humor.
— Ora, a saúde é um estado precário que não augura nada de bom.
— Concordo. Aliás, ninguém sabe o que Colombo teria descoberto se a América não estivesse no caminho.
— Nem mais. Um coxo apesar de tudo caminha.
— E até um olho de vidro vê a própria cegueira.
— Que quer isso dizer?
— Que na luta de ideias são sempre as pessoas que morrem.
— Ah, vejo. Numa avalanche nenhum floco de neve se sente responsável.
— Verdade. Mas a primeira condição para a imortalidade é a morte.
— Tal como a principal causa do divórcio é o casamento.
— Mas não concordo que se use a morte nem como castigo nem como recompensa.
— Então não perguntes a Deus o caminho a seguir para a felicidade, ele indica sempre o mais difícil.
— E se um canibal comer de garfo isso é um progresso?
— Vamos parar com isto?
— Melhor, sim. Está tudo nas mãos do homem, por isso é melhor lavá-las com frequência.